Empreendedorismo, empoderamento, brain storm, benchmarking; do nada algumas palavras simplesmente entram na moda.  Como se fossem gírias dos adultos, depois dos loucos anos da adolescência o mundo continua da mesma forma, com a diferença que passamos a não ter que pedir autorização aos pais (embora muitas passem a solicitar dos maridos), as brigas e picuinhas continuam quase as mesmas. Inocentemente quando somos jovens acreditamos que com 30 e poucos anos, seremos maduros e não teremos que gastar energia com pormenores, mas infelizmente continuamos nos deparando com infantilidades e competições que levam de nenhum lugar para lugar nenhum.

E o empreendedorismo hoje virou o crush de 8 entre 10 pessoas… quase como se fosse uma regra, tornou-se artigo de luxo. Claro que em tempos de crise a criatividade está a mil, e quando a água bate na bunda todo mundo aprende a nadar, mas o extinto de sobrevivência não pode ser confundido com empreendedorismo e o empreendedorismo não pode ser visto como peça da moda que qualquer um pode comprar.

O empreendedorismo é um estilo de vida, quase que intrínseco ao seu dono… ele não pode ser ensinado. Pode claro, ser lapidado e melhorado, desenvolvido, mas a mente empreendedora não é matéria que se aprende, quase sempre ele vem de mãos dadas com o dom de liderar, com a facilidade de persuadir e com a insistência quase burra de acreditar e não desistir.

O fato da pessoa não ter a mente empreendedora não faz com que ela seja melhor ou pior, assim como existem pessoas tí­midas e as desenvoltas, as que gostam de humanas e os que amam exatas, os que adoram vermelho e os que não suportam azul, existem os empreendedores e os não empreendedores e está TUDO BEM. Mas assim como nasce um meme ou como surge um hino chiclete como Despacito, o empreendedorismo passou a ser quase que obrigatório a todo mundo e de um dia pro outro, todos da cidade resolveram virar empreendedores de bolo ou de barbearia.

Sem desmerecer nenhum nicho de negócio, mas é que tem coisas que ficam claras ser modismos… ou vocês acham mesmo que uma loja de bolo a cada esquina sobreviverá por mais de 5 anos, que vai ter barba suficiente pras 956 novas barbearias que abrem por dia ou ainda que as mulheres manterão as sobrancelhas de carvão pro resto das eras??? Clarooo que daqui a 20 anos, algumas mulheres ainda terão “bolarias”, ainda existirão lugares para as mulheres arrumarem as sobrancelhas mesmo se a moda mudar e as barbearias mesmo quando os homens voltarem a querer fazer depilação definitiva, ainda terão os que gostam de barba… mas com certeza os que sobreviverem aos anos são os que iniciaram o negócio por paixão, que encararam o negócio com propósito e fizeram da profissão estilo de vida.

Não sei dizer ao certo se o que houve foi a popularização do empreendedorismo ou a gourmetização da coisa, ser empreendedor passou a ser status; num belo dia o mestre, Dr, PHD quase responsável pela eleição do Donald Trump sai de seu cargo de gerência onde ganhava 5 dígitos facilmente, pega sua bolada, compra um quadro canvas, separa um dos 5 quartos de sua humilde residência… vez que os filhos já cresceram, um está fazendo mochilão na Europa, a mais nova casou e está em Lua de Mel nas Maldivas e os quartos ficaram quase que ao Deus dará, gritando que a sí­ndrome do ninho vazio bateu a porta. E nasce um empreendedor de boutique, lotando as paredes de diplomas com os cursos mais renomados, ele sabe falar de mandari­m ao dialeto persa… mas esquece de dar bom dia ao porteiro. Alguns anos depois seu negócio montado de forma exí­mia, com os melhores funcionários e melhor localização que o dinheiro pode pagar, fecha as portas e no restaurante caro reclama aos amigos, que o problema do Brasil é o brasileiro, que os impostos são caros, que os funcionários não dão valor, que o mundo tem quase um complô contra sua “mente empreendedora” e que a coisa não deu certo…por isso, pq se fosse na Europa… ahhhhh lá com certeza teria dado.

Mas tem também em contrapartida o repentista do empreendedorismo, aquele que nasce da necessidade, mandado embora sem saber o que fazer passa a vender o almoço pra comprar a janta…rebolando entre fazer brigadeiro, bolo no pote, vender as lingerie “prazamiga” e os catálogo de Avon. Esse empreendedor faz tudo o que aparecer, nem ele sabe exatamente o que faz, vende do alfinete a mãe. Ele não anda, ele corre… não sabe onde quer chegar, mas vai que é uma beleza, passa a vida dando os seus pulos, forma seus filhos, cria seus netos e fala no final da vida que só não deu certo, pq o problema do Brasil é o brasileiro, paizinho egoísta que só valoriza os ricos, quem tem estudo. Que se fosse um país justo que ele pudesse ter tido estudo, com certeza seria mais rico que o Silvio Santos. Pois ideias ele tem mais que o Steve Jobs, o que falta é oportunidade.

E existe o genuí­no…O EMPREENDEDOR, de mente empreendedora. Quando era criança organizava as brincadeiras, sempre sonhou mais que todo mundo, as pessoas sempre duvidaram que ele chegaria lá, em algum lugar. A confiança em si beira quase o egocentrismo, não por se amar e se achar acima dos outros mas por acreditar piamente que ele pode fazer a diferença… mesmo que 1 pessoa dentre 7 bilhões seja uma estatística desanimadora, ele acredita que toda mudança começa de dentro e que evolui ao conseguir convencer o próximo que seu sonho vale a pena. Ele não tem amigos, consegue cercar-se de admiradores, pessoas que se inspiram nele… ele erra, mas não tem vergonha de pedir desculpas. Ele cai, mas não tem vergonha de levantar, ele faz do feedback seu alimento, ele considera a cópia um elogio, aprende a usar a inveja como forma de apreciação.

Ele não rouba planos ou surrupia propósitos… ele tem prioridades, ele sabe exatamente o porque começou. Ele sabe que network não é uma agenda cheia de nomes, que relacionamento não é troca de contatos, ele conhece quem ofereceu água quando esteve com sede… e de sede ele entende, quando ninguém acreditou nele, fazia da solidão sua companheira silenciosa e de seus sonhos amigos incentivadores. As vezes ele tem dinheiro no banco, mas nunca foi escravo de cifrões, outras vezes só tem as ideias na mente mas sua auto confiança vale mais que qualquer digito. Ele sabe se relacionar, passaria horas conversando com o porteiro enquanto espera desembargador, ele pode usar roupa de grife ou peças de brechó mas nunca vai precisar de etiqueta para deixar sua marca. Ele defende sua verdade, ele é fiel aos seus valores, ele não tem vergonha de sua origem, ele defende o humano, tem sororidade. Sabe o que é empatia e foge de julgamentos… excêntrico e sem verdades absolutas, ele tem a segurança de mudar de ideia mas nunca trai sua essência.

Claro que o empreendedorismo de palco é lindo, um verdadeiro espetáculo…com lucro certo, ganho imediato, garantido pela bilheteria. Mas ele tem horário  para começar e data certa para sair de cartaz, com o ambiente controlado, a iluminação cuidadosamente valorizando o cenário, os atores podem representar a realidade que mandar o roteiro, o personagem que couber na história. Mas quando as cortinas fecham, voltam a ser os mesmos de antes. O empreendedorismo na prática, é como o malabarista do semáforo; acorda sem saber onde vai dormir, necessita apresentar-se faça chuva ou sol, se não o fizer não come. Um transeunte, onde os veículos são os parceiros, clientes, investidores… onde os malabares são família, vida pessoal, amores. Não tem controle das variáveis mas depende do show para sobreviver, a persistência o capacita diariamente.

Existem empreendedores do bem e do mal, o empreendedorismo é uma qualidade que algumas pessoas tem outras não… assim como existem os de olhos verdes e os que tem olhos pretos, por mais que você use lentes, você não consegue mudar sua retina.  Pablo Escobar, o cara era um empreendedor nato mesmo sendo um narcotraficante, mas não podemos deixar de valorizar seu poder de empreender. Bruna Surfistinha, literalmente um PUTA empreendedora… numa era que a internet nem era tão difundida, fez sua fama através de um blog, inspirou livro, filme e série. O que eu quero demonstrar é que o empreendedorismo atinge todas as camadas sociais, o empreendedorismo é altamente democrático afinal ele é uma qualidade como outra qualquer.

Não sinta-se culpado se você não se vê empreendendo, se você não se sente empreendedor… isso não é vergonha, daqui a pouco essa palavra sai dos top 10. O que não pode são pessoas motivadas por propósitos plagiados, acabar com economias de uma vida,  pessoas incentivadas por verdades alheias perder-se num mundo que não é seu, comprando batalhas que não são suas, o empreendedorismo é o trabalho trançado com a vida pessoal, ele não é glamouroso embora tenha momentos de glamour, ele é uma apresentação de Ballet Bolshoi, lindo de se ver e admirar, perfeito para postar mas o dia a dia… são os pés descalços da bailarina, é batalha atrás de batalha, é buscar emprego todos os dias, reinventar-se a cada hora, ter você como seu principal incentivador.  Curtidas, seguidores, reações, são métricas da vaidade que não alimentam um empreendimento, um negócio vive de resultados e eles são muito mais que engajamento, resultados não é uma rede social ou uma hashtag, o resultado vem de levar muita cara na porta, de muito piano carregado, de muita noite perdida, jantar frio.

Empreendedorismo é semear, paciência, resiliência… por isso aquela fatí­dica pergunta: O que você faria até de graça? Ela não é uma pergunta filosófica, para ficar bonita num curso online, ela envolve tudo que você perderia pelo seu sonho, tudo que você abriria mão por acreditar que tem razão, tudo que renunciará para continuar com a mesma motivação.

Empreendedorismo não é curso de férias, passatempo para enquanto o marido trabalha, hobby pro momento que os filhos estão na escola, segundo plano pra quando o chefe encher o saco, plano b de um momento menos afortunado. Não é um “vou tentar, quem sabe?” “vai que rola…”, Empreendedorismo não é um: “se nada der certo” ou então ; “se eu tenho sorte”… Se tem algo que ele não é, é sorte. É trabalho, onde você é escravo de si mesmo, ví­tima de sua persistência, prisioneiro de sua disciplina.

Não gaste energia com sonhos alheios, invejando méritos emprestados, não cobice a champanhe se você não tem escopo para passar sede, não acompanhe “na bebedeira” se você não sabe cair. Não empreste brinde se você não aguenta a ressaca. É frustrante, desnecessário e insatisfatório para você e sua famí­lia. Invista tempo, amor e desejo no que realmente te apetece e não ser como os outros não é demérito, gostar da vida corporativa não lhe faz inferior, amar ser dona de casa não lhe tira o brilho, sonhar em vender coco na praia pode ser sua motivação, querer passar num concurso também é desafiador, não ser milionário não te deixa menos merecedor.

As vezes a grama do vizinho é mais verde, porque no meu gramado tem muito mais festas… ame suas qualidades, valorize sua história, respeite suas paixões, entenda suas motivações, viva suas verdades.

Escrito por:

STEPHANIE BRASIL | CEO MATERNÓLATRA

Stéphanie Brasil é uma uma advogada sonhadora que o mundo corporativo não conseguiu segurar, blogueira e mãepresária. Apaixonada pela vida, louca pelos filhos, leonina convicta, autoconfiança muitas vezes é mais defeito do que qualidade, otimismo é a sua especialidade. Criou a rede colaborativa Maternólatra que visa o resgate social das mães.

http://www.maternolatra.com.br/wordpress/